OS HOSPITAIS NA VILA INDUSTRIAL: DOS VARIOLOSOS E DOS MORFETICOS

OS HOSPITAIS NA VILA INDUSTRIAL: DOS VARIOLOSOS E DOS MORFETICOS

Junho 27, 2020 13 Por Ana Villanueva

Hospital dos Variolosos: 

Sobre a varíola na cidade de Campinas, a notícia mais antiga que se tem registros é a de 9 de outubro de 1854, quando a Câmara Municipal solicita ao sr. Domingos Roso a cessão de sua chácara, com a finalidade de recolher doentes de bexigas, mas o sr. Roso negou a solicitação respondendo que “não lhe era possível aceder a tal pedido, visto que nas casas da chácara moravam seus escravos, o que lhe causaria prejuízos” (BRITO, 1966, pp. 95-108).

No mesmo ano de 1854, a Câmara conseguiu um lugar chamado de Campo do Rancho Grande, que ficava no fundo do cemitério das Almas para servir provisoriamente de abrigo para os variolosos (BRITO, 1966, pp. 95-108).

A Câmara Municipal, em 16 de outubro de 1854, mandou que um fiscal se encarregasse de construir um rancho de 25 palmos em quadra, entre as estradas das fazendas “Sete Quedas” e a estrada de São Paulo, ao lado dos valos do capitão Elisiário de Camargo, e foi feito em “madeiras roliças, porém de qualidade, coberto de telhas com altura de 16 a 20 palmos, todo barreado em roda, mas sem compartimento algum interno” (BRITO, 1966, pp. 95-108).

Em 1858, houve a chamada “peste de bexigas”, o que levou a Câmara Municipal a tomar uma nova série de medidas para a saúde pública (LAPA, 1995, p. 218). 

E no ano de 1874, houve outra epidemia de varíola em Campinas, foi quando o coronel Joaquim Quirino dos Santos abriu e manteve as suas próprias custas um local para pobres chamado de lazareto dos variolosos (SANTOS FILHO, 1996, p. 93).

Posteriormente, em 1875, a Câmara Municipal assumiu a construção de um estabelecimento para esta finalidade, que foi erguido por meio de donativos particulares (AMARAL, 1899, p. 158). 

Em 1892, outra grande epidemia de varíola aconteceu na cidade, em especial no bairro do Botafogo (LAPA, 1995, p. 237).

Não existem registros do ano em que o hospital foi fechado, pode-se somente observar que nas plantas da cidade de Campinas dos anos de 1900 e 1916 constam dois lazaretos, o dos variolosos e o dos morféticos (Figuras 1 e 2).

Figura 1 – Planta da Cidade de Campinas de 1900.
Lazareto dos Variolosos, Lazareto dos Morpheticos e Matadouro
Tratamento de imagem: Maneco Silva 
Inserção de dados: Ana Villanueva 
Figura 2 – Planta da Cidade de Campinas de 1916.
Lazareto dos Variolosos, Lazareto dos Morpheticos e Matadouro
Tratamento de imagem: Maneco Silva 
Inserção de dados: Ana Villanueva 

A localização do antigo hospital dos variolosos, segundo a planta da cidade de Campinas de 1900, seria na atual avenida general Carneiro, na altura do numero 391, próximo ao 8º Batalhão da Polícia Militar. Pode-se verificar em fotografia do início do século XX, o local que possivelmente estaria este hospital (Figura 3).

Figura 3 – Vista aérea de Campinas no sentido Centro – Vila Industrial 
Acervo Museu da Imagem e do Som de Campinas
Coleção: Biblioteca Municipal de Campinas
Inserção de dados: Ana Villanueva 

Esta região no final do século XIX era considerado um “arrabalde” e fora do perímetro urbano de Campinas, os limites da linha férrea da Cia. Paulista dividiam o perímetro urbano (RODRIGUES, 1997). 

O Código Sanitário do Estado, de 1896, previa a proibição de construções consideradas “insalubres”, como hospital, matadouro, cortume, prisão, hospedaria, vila operária, entre outros, fora de “aglomeração urbana”, portanto a localização próxima ao atual bairro São Bernardo (LAPA, 1995, p. 185).

Hospital dos Morféticos: 

Desde 1813 a Câmara Municipal de Campinas demonstrava preocupação com os chamados morféticos ou lázaros, que perambulavam pelas estradas pedindo esmolas (BRITO, 1966, pp. 95-108). 

Os morféticos que passavam por Campinas eram encaminhados de forma obrigatória para o hospital dos lázaros da cidade de São Paulo e alguns para o hospital de Itu (BRITO, 1966, pp. 95-108).

A situação era de intolerância, e em alguns casos os doentes eram presos e obrigados a serem recolhidos, pois era “proihibido aos morpheticos vagarem pelas ruas e praças da cidade” (LAPA, 1995, p. 235).

Em 26 de outubro de 1845 a Câmara Municipal determinou que “todo aquele que der esmola ou contrair algum negócio com morféticos será multado em trinta mil réis” (BRITO, 1966, pp. 95-108).

A construção definitiva do hospital dos morféticos na cidade de Campinas, ficou estabelecido por proposta do procurador da Câmara sr. Rafael Sampaio, em 28 de agosto de 1876, “para que se autorizasse a compra da chácara do cidadão Teodoro de Menezes Forjas, para ali ser construído outro hospital dos morféticos e matadouro público” (BRITO, 1966, pp. 95-108).

Para viabilizar a edificação houve muitos donativos particulares. As obras foram realizadas sob a direção dos construtores Manoel José da Fonseca e João Pereira de Campos Becker. O local escolhido ficava na contravertente de uma das colinas que rodeavam a cidade no sentido sul e distante de 1 km do perímetro urbano. O hospital era singelo mas possuía “acomodações arejadas muito limpas e espaçosas” (AMARAL, 1899, p. 158).

O caminho para o hospital, no começo do século XX, foi descrito pelo historiador Benedito Barbosa Pupo da seguinte forma: “havia a entrada para o Curtume Campineiro e logo adiante a casa da família Rafael Pisani, que tinha ao lado uma extensa faixa de terreno ocupada por um grande parreiral. Logo a seguir, após o prolongamento da rua Prudente de Morais, que era a estrada para o Matadouro e para o Hospital dos Morféticos, ficava a chácara Pattom” (PUPO, 1995, P. 37). Este caminho pode ser visualizado nas plantas da cidade de Campinas dos anos de 1900 e 1916 (Figuras 1 e 2). 

O local do hospital era fora do perímetro urbano, com área no terreno que permitisse o plantio de hortaliças pelos próprios doentes (LAPA, 1995, p. 235).   

O complexo do hospital dos morféticos ficava quase aos fundos do Matadouro e pouco além foi construída também a Capela de São Lázaro, onde se celebravam também ofícios religiosos, que é possível visualizar na foto da Figura 4 (BRITO, 1966, pp. 95-108). 

Figura 4 – Foto do complexo do hospital dos Morféticos e Capela São Lázaro
Acervo: Museu da Imagem e do Som de Campinas
Coleção: Biblioteca Municipal de Campinas

Atualmente a localização deste complexo é aproximadamente onde situa-se o hospital Mário Gatti na av. Prefeito Faria Lima.

Até o ano de 1900 foram feitos 25 registros de doentes, dos quais: 16 brasileiros (3 campineiros), 5 portugueses, 2 suiços, 1 italiano e 1 espanhol (AMARAL, 1899, p. 158).

 Entre os anos de 1905 a 1925 é feito o segundo registro do “Livro de Registros de Enfermos do Asilo dos Morféticos, e constam 1187 entradas, com mais frequência da nacionalidade italiana (Arquivo Público Municipal).

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

AMARAL, Leopoldo. “A cidade de Campinas em 1900”. Campinas: Casa Livro Azul, 1899.

ARQUIVO PUBLICO MUNICIPAL. “Registros de Enfermos do Asilo dos Morféticos”. 2º Registro, 1905-1925

BRITO, Jolumá. “História da Cidade de Campinas”. Campinas: [s.n.], 1966, v.21.

LAPA, José Roberto do Amaral. “A cidade: os cantos e os antros: Campinas 1850-1900”. São Paulo: Editora da USP, 1996.

RODRIGUES, Ana A. Villanueva. “Preservação como Projeto. Area do pátio central das antigas Cia. Paulista e Cia. Mogiana – Campinas – SP”. São Paulo: Dissertação (mestrado), FAU – USP, 1997.

PUPO, Benedito Barbosa. “Oito Bananas por um Tostão: crônicas campineiras”. Campinas: Secretaria Municipal de Cultura, Esportes e Turismo, 1995, 2aed. 

SANTOS FILHO, Lycurgo de Castro. “A febre amarela em Campinas 1889-1900”. Campinas: CMU/UNICAMP, 1996.